segunda-feira, dezembro 21, 2009







NATAL


Acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.
Era gente a correr pela música acima.
Uma onda uma festa. Palavras a saltar.

Eram carpas ou mãos. Um soluço uma rima.
Guitarras guitarras. Ou talvez mar.
E acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.

Na tua boca. No teu rosto. No teu corpo acontecia.
No teu ritmo nos teus ritos.
No teu sono nos teus gestos. (Liturgia liturgia).
Nos teus gritos. Nos teus olhos quase aflitos.
E nos silêncios infinitos. Na tua noite e no teu dia.
No teu sol acontecia.

Era um sopro. Era um salmo. (Nostalgia nostalgia).
Todo o tempo num só tempo: andamento
de poesia. Era um susto. Ou sobressalto. E acontecia.
Na cidade lavada pela chuva. Em cada curva
acontecia. E em cada acaso. Como um pouco de água turva
na cidade agitada pelo vento.

Natal Natal (diziam). E acontecia.
Como se fosse na palavra a rosa brava
acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia.

Manuel Alegre

quinta-feira, dezembro 17, 2009









Com Essa Nuvem










Para que estrela estás crescendo,
filho, para que estrela matutina?
Diz-me, diz-me ao ouvido,
se é tempo ainda,
eu e essa nuvem, essa nuvem alta,
de irmos contigo.


Eugénio de Andrade

terça-feira, dezembro 08, 2009

POESIS - Tome o café matinal connosco, cada dia uma poema, um poeta, uma cultura






António Ramos Rosa


















Pressentimento



Pressenti-te, apenas, pressenti-te.


Eras o sonho insaciável da água


na obscura vinha do meu corpo.


Para ti construí em carícias de acaso


as apaixonadas palavras nubladas


pelo olvido. Talvez nelas perpasse


esse murmúrio de um lábio ébrio e volúvel


sempre oculto num indelével fluir.





in a Imagem e o Desejo, 1998